Há 25 anos Luiz ajuda a contar a história do Teatro Municipal
Em homenagem ao Dia dos Pais, a ser comemorado no próximo domingo, a Folha de Sabará conta a história de um pai muito especial, que, com muita dedicação e perseverança, venceu as adversidades e, hoje, é exemplo de que conhecimento e cultura vão muito além dos bancos escolares. Trata-se de Luiz Carlos Vieira, 57anos. Quem visita o Teatro Municipal certamente o conhece. Há 25 , ele está lá, logo na portaria, atendendo a todos que chegam, sejam turistas do Brasil ou de qualquer país do mundo, ou mesmo os moradores da cidade, e ajudando a contar, com riqueza de detalhes, a história da antiga Casa da Ópera de Sabará. “O teatro foi fundado em 1770, e restaurado em 1970. Durante 1912 a 1915, foi cinema mudo. Dom Pedro I e Dom Pedro II já estiveram aqui”, relata, com orgulho.
Nessas mais de duas décadas, o teatro se tornou parte da vida de Luiz e lá estão suas recordações mais felizes, como dos três filhos, que, às vezes, o acompanhavam no trabalho. “Eles passaram parte da infância aqui, correndo entre as cadeiras da plateia, brincando no palco. Adoravam!”, recorda-se. Embora não tenham se enveredado para o caminho das artes, Gabriel, 28, Diego, 24, e Alethia, 22, até hoje, compartilham com o pai a paixão pelo lugar. O Teatro Municipal de Sabará foi para Luiz o cenário de outros momentos inesquecíveis. Um dos mais marcantes aconteceu no ano passado, durante apresentação do percussionista Naná Vasconcelos. “Quando ele chegou, eu disse que era um grande fã do seu trabalho e mostrei os quatro discos dele que comprei. No palco, Naná falou que estava muito emocionado porque tinha encontrado em Sabará uma pessoa com um disco raro, que ele gravou no período que morava na Alemanha, e fez uma homenagem a mim. Fiquei muito feliz”, diz.
Foram igualmente marcantes os momentos vividos durante os “tempos de glória” do teatro, de 1970 a 1982. Neste período, o local, então administrado pela Fundação Clóvis Salgado, foi palco de grandes espetáculos nacionais e internacionais e Luiz ficou conhecendo artistas renomados, como os atores Paulo Autran, José Mayer, o pianista Jaques Klein, entre outros. Nessa época, segundo Luiz, o fluxo de turistas estrangeiros era enorme, principalmente alemães e franceses. “Toda semana, costumava receber, por exemplo, um grupo de até 44 pessoas da Alemanha”, lembra. Foi aí que despertou nele a vontade de aprender os idiomas francês e alemão. “Chegavam os grupos da Alemanha e da França e eu não conseguia me comunicar com eles, não entendia uma palavra do que diziam e isso me incomodava muito. Então, comecei a estudar sozinho, pesquisava nos livros e ficava treinando como se dizia determinada frase em francês e em alemão. Sempre fui autodidata, nunca tive dinheiro para pagar escola ou professor”, fala.
O empenho e a força de vontade de Luiz acabaram sensibilizando os ex-prefeitos Sérgio Freitas e Wander Borges, hoje deputado estadual, que lhe presentearam com cursos, em CDS e livros, dos dois idiomas. Hoje, Luiz, que estudou apenas até o 1º ano do Ensino Médio, consegue conversar nos três idiomas: inglês, francês e alemão. Destes, diz que o último é o mais difícil. “Quando digo que estou estudando alemão, as pessoas me chamam de louco porque, realmente, é dificílimo”, revela. Mas, o importante é que Luiz tem conseguido êxito, a ponto de conquistar o reconhecimento do Consulado da Alemanha, que, em 2006, enviou a ele uma mensagem agradecendo seus esforços para que os turistas alemães pudessem aproveitar, ao máximo, as visitas ao Teatro. Após tomar conhecimento do grande interesse de Luiz pela cultura alemã, o Consulado passou a enviar, mensalmente, revistas e livros para que ele continue aperfeiçoando o idioma. Ele ainda recebeu uma dedicatória do Cônsul Honorário da Alemanha, em Belo Horizonte, Hans Kampek, que o tratou como “incansável colaborador no intercâmbio cultural Brasil e Alemanha”.
O reconhecimento vem também da França. Recentemente, ele recebeu um telegrama de quatro casais da França, agradecendo a recepção em “excelente francês”. Sem esconder o grande orgulho que sente por isso, Luiz afirma que acabou se apaixonando por esses países e também pela Suíça e Itália. “Meu sonho é poder conhecer a Europa. Tenho amigos de todos os países de lá e todos me convidam para visitá-los. Mas não tenho recursos”, lamenta.
Teatro
Segundo Luiz, o fluxo de turistas estrangeiros caiu consideravelmente, mas o público internacional continua visitando o Teatro. “E eles ficam fascinados”, diz, explicando o porquê desse fascínio. “A beleza daqui está na simplicidade, não tem nada de luxo e, mesmo assim, é considerado um dos teatros mais belos do mundo”, orgulha-se. Embora o público já não compareça com a intensidade de antes, Luiz afirma que está enganado quem pensa que o Teatro Municipal está decadente. Pelo contrário, a agenda está sempre lotada de grandes espetáculos. “No ano passado, por exemplo, a Natura promoveu o “Sabará Musical”, que trouxe à cidade grandes artistas, como João Donato e Paulo Moura, Chico Amaral e Toninho Horta, entre muitos outros. Tivemos ainda a apresentação da ópera francesa ‘A descida de Orfeu aos infernos’, como parte da programação do Ano da França no Brasil. Foi uma noite de gala”, observa.
Em julho, segundo Luiz, durante o Festival de Inverno, quase todos os espetáculos tiveram lotação completa. Atualmente, ele diz que o público que frequenta o teatro é muito diverso, pessoas de todas as idades e de todas as classes sociais. O que costuma fazer a diferença é o tipo de espetáculo. As comédias, por exemplo, são as que mais atraem o público.
Agora, a grande expectativa de Luiz é a Copa do Mundo de 2014. Ele acredita que a competição irá incrementar muito o movimento no teatro. “Torço para que tenham muitos jogos da França e da Alemanha em Belo Horizonte. Aí os turistas dos dois países poderão vir para cá”, acredita.
Exemplo
Filho de pais analfabetos, Luiz não teve condições de concluir o Ensino Médio, mas, a partir do teatro, descobriu nos livros, na música e no cinema um mundo de cultura e conhecimento sem fronteiras. “Tive a sorte de conhecer muitas pessoas que me incentivaram a ler e me doaram muitos livros”, conta. Mesmo sem a visão do olho direito e longe dos bancos escolares, ele nunca deixou de estudar. “Não existe nada mais importante que os estudos, sempre disse isso aos meus filhos”. É esta convicção que está animando Luiz a entrar num curso supletivo. Seu objetivo é passar num concurso público. É o seu plano para quando se aposentar, daqui a três anos. Isso não significa, no entanto, que ele vai ficar longe do teatro. “Não tem como. Mesmo quando eu não estiver aqui, vou continuar sonhando com o teatro, com os artistas no palco e muita gente na plateia. Isso aqui é a minha vida”, finaliza.
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